quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Inocência



"Porque à vida lhe agrada amargar o sentido
íntimo das coisas nao poderás entender mais

o homem solitário que passeia o cachorro cada dia
pelo atardecer do porto(...)
(...) O tempo é como um menino
que perdeu a sua mãe e a está buscando"

GIL, Raimon. Subtítols. In Reduccions no. 87 pg.33. Eumo Editorial. Barcelona, 2007. Tradução pessoal a partir do original em catalão. Mais sobre o autor em
http://subtitols.blogspot.com


Foto: Meu arquivo pessoal. Eu e meus irmaos em 1.982.

O piano melancólico de Yann Tiersen me remete às minhas primeiras aulas de piano e o início de um tempo sombrio onde as dores do mundo começavam a pesar sobre meus ombros, enfraquecendo-me até a morte da inocência, para enfim renascer uma pessoa adulta pesada e triste.
Perceber que se tornou um adulto é saber discernir quando a inocência dá lugar ao rancor, e que as nuvens não são de algodão e já não formam mais ursinhos ou corações, mas tempestades e furacões, e esvaem-se como os nossos sonhos, que finalmente percebemos ser apenas devaneios infantis, ilusões inatingíveis e que o parque de diversões é apenas um lugar nostálgico, um depósito de fantasmas do qual sempre buscamos fugir.
Somos adultos quando não sentimos mais medo da chuva nem choramos mais pelos cachorros abandonados nas ruas, quando somos capazes de fechar os vidros do carro diante das crianças que esmolam dinheiro no farol, e quando passamos alheios ao frio e à solidão das prostitutas e dos moradores de rua.
A inocência é tão curta quanto essa canção, e é triste esse piano que me mostra o quão amargo é crescer.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Paisagem

“Nos colocaram no bolo
Como um casal de noivos.
Se temos que esperar a faca
Faremos por ficar no mesmo pedaço.”

Ronny Someck. Poema da felicidade. Editorial Proa. Traduçao pessoal a partir do catalao disponível em http://subtitols.blogspot.com/

Foto by: Sonia Bao. Palamós, Espanha

O ruído das ondas rebentando nas pedras e o motor de um barco ou outro que passa me remetem a um tempo feliz, de paz e tranqüilidade. Ao longe vejo um único barco branco e solitário lutando para não ser ofuscado pela beleza do sol refletido na água, presenteando-me com um magistral espetáculo nesta linda manhã de domingo.


Minhas lembranças são como o barco branco e solitário quase invisível diante do brilho das águas fundindo-se entre si como um mosaico para formar ao final uma única paisagem; a minha história.

Aos domingos bem cedo costumávamos ir a ver o sol nascer. Ele pegava a minha mão e eu me sentia como uma criança – e em verdade o era – e nos abraçávamos buscando amenizar a sensação da fria brisa da manhã. Era um cenário sublime, e meu coração disparava de alegria em poder compartir algo tão singelo e bonito.


Meus pensamentos viajam rápidos e curtos como as nuvens que agora vejo passeando pelo céu e me recordo os dias em que me deitava na grama à beira do lago do Ibirapuera observando as figuras de nuvens e ponderando o impossível, viver um dia outra vez um amor como havia sido aquele.

E hoje, um agradável domingo de outono, estirada em uma pedra do costado a ler, sento-me para olhar o mar que brilha ao sol como um lindo cartão postal o vejo ao meu lado. Ele sorri para mim e eu agradeço à vida por permitir-me viver essa felicidade mais uma vez.

domingo, 4 de novembro de 2007

Fragmentos

“ O mundo é isso - revelou - Um montão de gente, um mar de foguinhos. Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as demais. Não há dois fogos iguais.”

GALEANO, Eduardo. El Viaje. In El Mundo, pg. 15. Coleção Mini letras. Ed. Onlybook. Madri, 2006. Traduçao pessoal do original em espanhol.



Foto by Raimon Gil. Cala margarida, Espanha.

O meu coração é uma parede com fotos antigas de família e de paisagens esquecidas, dessas que quando atentamente observadas nos contam histórias pessoais e que em algum momento interessam a alguém. Fragmentos de vidas que se cruzam e ao final encontram-se na parede memorial de minhas lembranças. Alguns personagens já anônimos pela distância do tempo entre o fato real e minha vaga recordação, mas sua imagem e seu legado ainda vivos através de suas histórias individuais. Pessoas são como pequenos livros temáticos que nos cativam pela singularidade de suas marcas, e através de seus exemplos, fixando aos poucos e definitivamente suas características na memória e no coração dos saudosistas, que por capricho pessoal nunca aprendem o que é olvidar.

Shows em Barcelona