"Porque à vida lhe agrada amargar o sentido
íntimo das coisas nao poderás entender mais
o homem solitário que passeia o cachorro cada dia
pelo atardecer do porto(...)
(...) O tempo é como um menino
que perdeu a sua mãe e a está buscando"
GIL, Raimon. Subtítols. In Reduccions no. 87 pg.33. Eumo Editorial. Barcelona, 2007. Tradução pessoal a partir do original em catalão. Mais sobre o autor em http://subtitols.blogspot.com
O piano melancólico de Yann Tiersen me remete às minhas primeiras aulas de piano e o início de um tempo sombrio onde as dores do mundo começavam a pesar sobre meus ombros, enfraquecendo-me até a morte da inocência, para enfim renascer uma pessoa adulta pesada e triste.
Perceber que se tornou um adulto é saber discernir quando a inocência dá lugar ao rancor, e que as nuvens não são de algodão e já não formam mais ursinhos ou corações, mas tempestades e furacões, e esvaem-se como os nossos sonhos, que finalmente percebemos ser apenas devaneios infantis, ilusões inatingíveis e que o parque de diversões é apenas um lugar nostálgico, um depósito de fantasmas do qual sempre buscamos fugir.
Somos adultos quando não sentimos mais medo da chuva nem choramos mais pelos cachorros abandonados nas ruas, quando somos capazes de fechar os vidros do carro diante das crianças que esmolam dinheiro no farol, e quando passamos alheios ao frio e à solidão das prostitutas e dos moradores de rua.
A inocência é tão curta quanto essa canção, e é triste esse piano que me mostra o quão amargo é crescer.